terça-feira, 11 de novembro de 2008

Sobre cupins e alados


De todos os verdadeiros amigos que tenho na vida, daqueles que só o percebemos quando são parte imprescindível da nossa existência, estando atados por nós dados pouco a pouco na colcha do tempo, o meu amigo-melhor Gabriel é um dos que se destaca; não somente pelo seu grandessíssimo naralho (que rivaliza com o narigão de outro amigo meu, o grande Foca), tampouco somente pela sua sabedoria, retidão e confiança, mas creio principalmente pelo seu modo de honrar nossa amizade, ou seja: ele é “pau pra toda obra”, “amigo pra caralho”, aliado à sua soberba companhia agradável de sempre.

Além disso, sempre fiquei maravilhado com certas coincidências. Principalmente quando você não espera por nada, talvez porque não estivesse pensando no lance, e ela vem com uma força arrebatadora, te espreme por baixo do teu nariz clamando:

"Olhe, olhe só! Venço o caos da vida e instauro um momento de aparente magia e causalidade! E nem me venha com essa história chinfrim de que você não pensou nem por um segundo em Oxalá, Kami-sama, ou um puto inominado Deus, seu idiota, que eu sei que na sua pequenez você se pegou pensando ‘porra!’”.

Só que hoje não foi desse jeito, o que em nada diminui o meu contentamento, pelo contrário, se mescla alegremente com o coaxar dos sapos que entopem os canos aqui do prédio velho no Cepaigo; eles sim, mais felizes ainda com essa chuva que eu, que acho que ela poderia se estender por uns bons 10 dias sem que me passasse um segundo de preocupação com o “transtorno” que a chuva traz.

Almoçando, olhando as nuvens que antes estavam bem carregadas, um fio de vento a soprar, eu lembrei da Pamonharia Bueno. Ah, minha segunda toca, meu boteco sem ser botequin, tipicamente goiano, onde o queijo minas era tão fresco que vinha bem molinho derretendo no prato. Íamos eu e o Gabriel pra lá costumeiramente, mas tentamos arrastar ainda alguns de nossos amigos, mas calhava-nos pela proximidade dos lares {o meu era bem em frente, eu podia voltar bêbado que fosse [só precisava não ser esmagado como um sapo na T4 (crooarrr.... croaarrr!)]}.

A Bohemia® ainda não era uma cerveja produzida em ultralarga escala, portanto ainda conservava alguma excepcionalidade, e constantemente seu sabor que me lembrava “flores” (e que felicidade ao saber que não era o único no mundo a achar, a Paula também me disse o mesmo! Não era maluquice minha!), o queijo era bom, a mesa era a de sempre, o garçom cara de jeca-tatu também, e tudo era barato. E em bons tempos de trabalhos e provas finais, tantas “preocupações” e receios, nossos embates filosóficos se tornavam cada vez mais acirrados.

Era com esta nostalgia presente; abrindo meu correio electrónico, vi que meu velho amigo havia deixado um comentário numa de minhas postagens. Um pequeno poema de Nietzsche, chamado “Entre amigos (um epílogo)”, que pedindo já licença tomo a liberdade de reproduzi-lo aqui.

Entre amigos (Um epílogo) – F. Nietzsche

1.
É belo guardar silêncio juntos
Ainda mais belo sorrir juntos -
Sob a tenda do céu de seda
Encostado ao musgo da faia
Dar boas risadas com os amigos
Os dentes brancos mostrando

Se fiz bem, vamos manter silêncio;
Se fiz mal - vamos rir então
E fazer sempre pior,
Fazendo pior, rindo mais alto
Até descermos à cova

Amigos! Assim deve ser? -
Amém! E até mais ver!

2.
Sem desculpas! Sem perdão!
Vocês contentes, de coração livre,
Queiram dar, a este livro irrazoável,
Ouvido, coração e abrigo!
Creiam, amigos, a minha desrazão
Não foi para mim uma maldição!

O que EU acho, o que EU busco -,

Já se encontrou em algum livro?
Queiram honrar em mim os tolos!
E aprender, com este livro insano,
Como a razão chegou - "à razão"!

Então, amigos, assim deve ser?
Amém! e até mais ver!

Como um texto tão belo e alusivo, será que poderia dizer mais do que suas palavras escritas? Me pego então pensando... A intenção do meu amigo; qual frase ele repousa o olhar e se lembra de mim... Qual a real intenção de meu amigo ao enviar este poema como comentário, um poema que por si só é ambíguo, mas claríssimo; analisando todo o contexto, será que poderia haver outra leitura?

Digo isto pois senti um sonoro arrepio ao ler a frase, “até descermos à cova” pois me recordara imediatamente de “Lie in our graves”. Se existisse um culpado por mais esta ligação seria com toda a certeza o infeliz do Gabriel, sujeito e substrato, também condenado por colaborar com meu reencontro espiritual com o Rio de Janeiro neste ano, há um mês e pouco atrás.

Enredado pelas indagações que a linguagem críptica nietzscheana do pequeno epílogo me trouxe, sinto que estou muito sufocado pelas paredes para pensar, e vou ver um pouco a chuva lá fora pra espairecer. Qual minha surpresa, quando chego à porta, pequenas “aleluias” estão alçando seu vôo desajeitado da grama, enquanto pardais, bem-te-vis e suiriris as atacam em pleno vôo (o que considero sempre um ótimo presságio meu amigo Gabriel!).

Oras caralho, existe mais alguma coisa a me jogar nessa dialética, neste pensar que se cai por inacabado? Um momento Sr. Universo, preciso saber qual a intenção de meu amigo, se existia ainda algo que não estava a descoberto! Não preciso de mais avisos que me lancem mais e mais à esta problemática!

Será que ele teme que eu possa estar me quedando demais por um livro, e a transcrição de todas as suas teses seria contraditório, um tiro no pé? Assim ele me lembra, com toda a alegria, de Nietzsche e seu caráter anticientífico, antidoutrinário, contra todos os ídolos e a própria razão! Uma preocupação legítima já que, após um ano de existência deste pequeno espaço, minha proposta inicial era buscar um caminho único, um pouco como os ronins do antigo Japão feudal.

Guiar me por um livro, mesmo que somente como roteiro interpretativo, poderia interferir de forma decisiva nesta jornada, no meu aprendizado. Poderia interferir na leitura de meus amigos, dos que chegam aleatoriamente a este nicho. Serviria então como um alerta sutil e elaborado de meu irmão, de alguma forma, neste intuito.

Talvez ele quisesse relembrar a distância que teima em antepor entre os amigos e todas as outras pessoas e seus afetos, distância que esmaece vagarosamente as cores da casa; mas esta distância e o tempo não são um empecilho muito grande, visto que a cada reencontro, agimos como se nada houvesse estado, este tempo imenso, entre a vida.

Ou ainda: as pequenas mágoas, os desentendimentos, estes desencontros que vão interferindo na comunicação entre os seres, imersos em uma necessidade cada vez mais preemente de auto-afirmação e competição; o lugar para a solidariedade e cooperação no mundo atual cada vez mais distante, perdido numa das utopias libertárias dos anos 60, pois estes seres são nascidos em uma época onde ainda há o vislumbre do utópico, embora o presente se encarregue cada vez mais de apagar a ferro e fogo a memória destes sonhos por dias melhores. "As coisas são assim, acostume-se".

Angustiado, com todas estas pequenas conclusões provisórias; pensativo, ensimesmado, assaltado pelas conjecturas do universo, que me remetia cada vez mais a este poema que teimava em se apresentar tão claro mas tão distante, eu estava.

Quando eu, de algum modo, compreendi.

Muito obrigado.

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Ps: O blog do meu amigo Gabriel é o Usina de Pensamentos.
Recomendo uma boa lida, está nos links ali ao lado.

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

A Sociedade do Espetáculo - 2

2
As imagens fluem desligadas de cada aspecto da vida e fundem-se num curso comum, de forma que a unidade da vida não mais pode ser restabelecida. A realidade considerada parcialmente reflete em sua própria unidade geral um pseudo mundo à parte, objeto de pura contemplação. A especialização das imagens do mundo acaba numa imagem autonomizada, onde o mentiroso mente a si próprio. O espetáculo em geral, como inversão concreta da vida, é o movimento autônomo do não-vivo.

domingo, 9 de novembro de 2008

A Sociedade do Espetáculo - 1


1

Toda a vida das sociedades nas quais reinam as condições modernas de produção se anuncia como uma imensa acumulação de espetáculos. Tudo o que era diretamente vivido se esvai na fumaça da representação.

sábado, 8 de novembro de 2008

A Sociedade do Espetáculo, de Guy Debord

CAPITULO I
A SEPARAÇÃO ACABADA

Nosso tempo, sem dúvida . . . prefere a imagem à coisa, a cópia ao original, a representação à realidade, a aparência ao ser. . . O que é sagrado para ele, não é senão ilusão, mas o que é profano é a verdade. Melhor, o sagrado cresce a seus olhos à medida que decresce a verdade e que a ilusão aumenta, de modo que para ele o cúmulo da ilusão é também o cúmulo do sagrado.

Feuerbach - Prefácio à segunda edição de A Essência do Cristianismo.

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Inicio agora um projeto de publicar todos os ditos de A Sociedade do Espetáculo, livro de Guy Debord, publicado em 1967. Com isso, espero uma vez ao dia publicar um "aforismo" de Debord. Não quer dizer que deixo de lado a proposta inicial do blog, que é a expressão de manifestações minhas, íntimas ou não. Procuro, talvez, dar mais regularidade e realidade ao meu projeto. Salut!

terça-feira, 28 de outubro de 2008

What I’ll Miss About George W.


sensacional: The New Yorker

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Now playing: Phish - Foam
via FoxyTunes

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Chegaremos às Índias, meu capitão?

"Porra...
Será que vai?
...
Já sei"

(
Celular: tec tec tec tec)

Filho
: Será a melhora da morte? Ou agora a gente escapa? Qual seu prognóstico meu paizão?

(Muito longe, outras mãos tecem: tec tec tec ...
)

Pai: Numsei...
pensei...
simsei!
bemsei:
esperansei
.

"Navegar é preciso; viver não é preciso".

terça-feira, 21 de outubro de 2008

O gato vadio


Chamava a atenção; depois reclamava do assédio. O descuido no trato com as coisas não era o que importava; era o oposto, o magnífico cuidado com todas as pessoas que deslumbrava, fascinava, diferenciava.

Pusilânime.

Talvez aí residissem os problemas na convivência. Por que se angustiar com as pequenas coisas... Mas não somente; o que se observava (ou só se observava) eram os pequenos acintes da vida cotidiana. O desviar a atenção, resvalar com o ocorrido e deleitar-se, como tudo isso era difícil (lembrávamos...) em certos dias na vida.

Dias que se prenunciavam serenos. Mas não. Algo de brilhante conseguia destruir a pretensão inútil do equilíbrio. Seriam sintomas de alguma doença? Mede-se o pulso: o que hoje habita incontinenti também se cansará.

Tudo porque aquele gato vadio, que se esgueira sempre pelo muro, desceu a terra. Primeiro, olhava de soslaio, o deslizar vagaroso sobre o fio que fundava e estancava as divisões da propriedade. Fingia que não era com ele, eu absorto em meus polegares, quando saltou à pilha de tijolos, o barro cozido aguardando o retomar da obra, das reformas, da ampliação e da demolição.

Agora repousa ao meu lado, ronrona baixo. Pensamos juntos, eu e o gato. Ele, não sei o que pensa. Possui aquela consciência de ser uno com o universo, coisa que abdicamos tempos atrás quando descemos das árvores e fomos experimentar as savanas. Eu, ainda penso no muito que ganhamos, sentindo falta do que perdemos, com esse gambito.


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Now playing: Esbjörn Svensson Trio - 'Round Midnight
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terça-feira, 23 de setembro de 2008

A headstone (pour le passé des moments difficiles)


Epitaph:
All that you touch
All that you see
All that you taste
All you feel.

All that you love
All that you hate
All you distrust
All you save.

All that you give
All that you deal
All that you buy,
Beg, borrow or steal.

All you create
All you destroy
All that you do
All that you say.

All that you eat
And everyone you meet
All that you slight
And everyone you fight.

All that is now
All that is gone
All thats to come
And everything under the sun is in tune
But the sun is eclipsed by the moon.

(There is no dark side of the moon really.
matter of fact its all dark.)


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Now playing: Pink Floyd - Echoes
via FoxyTunes

The Great Gig in the Sky...



domingo, 31 de agosto de 2008

Darwish

" - Que larica é essa Jarbas?
- Pois é, bem que a Berenice me avisou para não exagerar..."


"- Ih, sujou!
- Teje preso maconhero!"

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

"And I knew it was a dream"

O que eu tenho para dizer?

Posso, talvez, tentar, agora que já se passou tanto tempo, reconstituir a cinemática daquele movimento contido, os passos medidos, o bater dos saltos no cimento riscado; muito embora tudo exposto é quase certo que esta própria imagem que possuo daquele quadro, firme inscrita em algum ponto vago de minha mente, esteja banhada de tons que não me remetem à estética que tanto admirei, ao ponto de achar como o melhor quadro em movimento que já havia visto em toda a minha vida.

Se me lembro das luzes dos postes? Pudera ser daquelas que atraem garbosas aleluias após as primeiras chuvas de verão: suas pequenas asas se soltando após o impacto com a lâmpada quente; o etéreo vapor que surge no momento do sublimar de suas pequenas antenas; enfim, a queda solitária destes Ícaros tão substanciais e tão ignorados por nós.

Não creio. Pela imagem que teima em trepidar quando fecho meus olhos à noite, acho que eram luzes brancas: inertes, profiláticas, sanitárias. Mais que isso: luzes que, num jogo de esconde e surge, delimitavam muito bem o passeio na qual ela desfilava.

Foi poucos dias antes da morte de meu pai.

Eu já havia a visto algumas vezes pelos corredores. Não havia chamado a minha atenção de pronto, embora fosse linda, de feições delicadas, mas olhar forte. Decididamente, era uma das mais belas de nossas salas.

Ocorre que, à época, eu pensava em outras coisas: coisas que me impediam de todo a despertar. Filosofava em esquinas e beiradas, no mundo lírico que desatava em mim os maiores sentimentos que já sentira, disso eu tinha certeza.

Aliás, minto. Embora te confesse isto, hoje vejo como tudo é apenas romantismo. E é justamente este mesmo romântico que me acossa no agora, quando tento revisitar esta pequena nódoa de passado que navega em meus sonhos.

Aquele dia, em especial, seria como todos os outros. Exceto porque ela estava em minha sala. Donde podia observar o quarto da mulher das cortinas do outro lado da rua: janelas largas donde ela abria e fechava as cortinas de forma incessante, fazendo as vezes de obturador.

Um pouco antes, certo dia, eu conseguira ser alcançado pela mulher das cortinas, enquanto atravessava as ruas para a biblioteca. Ela se apossou do meu lado, me espiando com uns olhos frios. Um calafrio percorreu-me com aquela vista tão cristalina, tão contundente. Permiti um minuto para que ela tentasse esboçar alguma conversa, embora já soubesse, por outros, que ela nunca falava nada.

Só os olhos me olhavam. Olhos que pareciam vivos, apartados dela. Íris flamejantes que buscavam em cada abertura de minha guarda uma brecha para picotar meus pensamentos. Sentia um incômodo tão grande, que só consegui murmurar um “boa tarde” enquanto me escorregava pra longe daqueles laços. A mulher das cortinas permaneceu no mesmo lugar desde então.

Mas como havia dito, estávamos em minha sala: eu, meus chefes, meus subordinados, e ela. A burocracia que me afastava milhas de todos os meus colegas de trabalho permitiu que, entre a interminável soma de números e projeções, eu conseguisse prestar um mínimo de atenção e vislumbrar seu abandono: no modo como ela arrumava os cabelos atrás da orelha, na displicência do balançar os sapatos na ponta dos dedos enquanto escrevia, no olhar triste que se erguia das folhas e papéis para acompanhar o espetáculo que não merecia sua atenção.

Pouco tempo depois, acho que lembro que ela me olhou. Eu tenho absoluta certeza da cara que de espanto que estaria passando, embora possa estar exagerando. Ali, em pleno árido, a maravilha, única, exuberante, tão oculta porque tão evidente. Sei que com esse olhar, devo ter passado uma impressão de bobo, de perdido. Mas eu estava evidentemente desnorteado. Tão desnorteado que perscrutei os edifícios do outro lado, procurando a senhora da janela com cortinas, mas onde deveria estar seu abre e fecha, encontrei as cortinas fechadas.

As horas transcorriam enquanto eu continuava absorto em minha nova descoberta, a minha nova alegria. Ela não me olhou mais, e hoje duvido que tenha olhado da primeira vez: a lembrança nos prega peças.

O que sei é que o tempo voltou a correr quando os participantes levantaram, dando por encerrada a reunião.

Assustado, eu recompus meus papéis e livros, já que pego de surpresa. Murmurei alguns cumprimentos e apertos de mão frios, em conjunto a tapinhas no ombro que simbolizavam a hipocrisia que operava a sala entre os participantes. Enquanto saíamos, alguns ainda conseguiram me retardar, procurando explicações sobre números que eu não havia dito, nem sobre os quais, ditos por outros, eu prestara o mínimo de atenção. E eu perdi momentaneamente de vista aquela que habitaria meus sonhos pouco tempo depois.

Saindo da sala, nos corredores angulosos, alguns colegas me chamavam para farras e putarias: era sexta-feira. Eu pressupus que, pelo tardar da hora, ela tomaria o rumo da condução, para sua casa, ou para qualquer outro lugar que eu desconhecia e torcia para que não existisse. Porque eu torcia para que eu tivesse lido o concreto, a solidão que existia nela, e que esta fosse sua verdade. Solidão que eu trataria de preencher completamente, sim, este era meu desejo.

Desvencilhando dos vários colegas que se apinhavam em meu caminho, atrasando-me inutilmente, dobrei a curva do último corredor que dava para fora do prédio, rumo ao estacionamento e a condução.

E ali ela caminhava.

Os passos contidos, o movimento medido. Tentei ainda me fazer presente: gracejei alto com uma outra que ali passava, pedindo veladamente sua atenção, com o que ela não olhou pra trás. Mas em meu ser, eu sabia que sua cadência era uma espera pera minha chegada. Nos metros daquele pátio que separavam o estacionamento da condução, ainda tive a presença de espírito de tentar acertar o passo. A distância ora diminuía, ora aumentava. Alguns outros passeavam por ali, chaves de carro na mão, almas finadas. Ela nunca olhou para trás, em nenhum momento.

A distância, que se encurtava cada vez mais, trazia-me para a conclusão íntima de chamá-la, desfecho do filme em câmera lenta. Pouco a pouco, elaborava as frases que usaria para conseguir trazê-la ao meu labirinto: mostrar-lhe alguns caminhos e outros desvios, no emaranhado poético que é a vida. Não sei porque, tive a certeza de que se eu falasse qualquer frase, tudo se encaminharia, aos trancos e barrancos que fosse, mas ali seria o início.

E foi com esta cena: ela flutuando à minha frente, em uma noite sem ventos, onde as luzes frias não conseguiam trazer nenhum calor porque todo o brilho do momento estava concentrando em sua silhueta, e na qual eu caprichosamente, passos atrás, partilhava com o universo a total admiração pelo momento sublime, que aconteceu.

Estanquei. Deixei-a ir.

Se me perguntasses por que, juro, acho que a mentira que contei a mim é que não era um bom momento. Haveria outras chances. A vida sendo tão imensa, não poderia se esgotar naquela perseguição lenta, naquele jogo onde ninguém ganharia nada, só eu teria a perder, mormente eu era o único a jogar. A vida deveria ser maior, mais brilhante que ela, mais movimentada, mais acelerada...

Na verdade, o que me fez acovardar no instante exato foi a imagem que saltou à mente, imagem esta que obnubilou a estética da perfeição que eu estava seguindo. Sem nenhum motivo aparente, fui acometido por uma paralisia tremenda após me lembrar da senhora e suas cortinas.

Seu abrir e fechar incessante; seu obturador perscrutando minha vida inteira da janela ampla de seu quarto; dos olhos que podiam me ler completamente e me julgar por qualquer falha, mínima que seja. A senhora que conseguiu extinguir meu movimento. E eu vendo minha atriz esvaindo-se nas brumas que surgiram lentamente na noite, trilhando seu caminho que eu ainda achava que um dia poderia conhecer.

O futuro foi que não me ocorreu nada disso.

No domingo, soube que meu pai falecera. Viajei à minha terra para seu funeral e para enterrá-lo. Quando voltei, uma semana depois, ela havia partido de nossas salas. Acho que alçara outros sonhos.

Sentia-me tão minúsculo àqueles tempos que nunca perguntei nada a ninguém sobre ela: quem era, seu nome, de onde veio ou para onde foi, qualquer contato.

Quando dei por mim, ninguém mais se lembrava dela em suas vidas.

Isso foi há muito tempo... é bem provável que seja tudo parte do mesmo sonho, que persigo há tanto tempo e, imerso, faça parte; navego por ele, luto por ele, sou constantemente trazido à praia após inúmeros deslizes. Vendo com olhos distantes, não acho que tenha perdido tanto ao extirpar mais esta escolha de minha vida.

O que sobrou? Talvez um quê de como pudesse ter sido.

Mas já não me autorizo a sonhar mais que isso.

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"I was flying through space
and I knew it was a dream
cause I never flew before

and the stars were going past me
and the planets were going past me
and I knew it was a dream

cause I never flew before

I went further and further away until I saw this tiny blue planet
and something made me want to go there
and I thought it was a dream
cause I never flew before

and I went down to this little planet..."
DMB - #41 (20/04/2002)

Labuta

[13:37]
a bla nsis cm a so nsid a ajdsjks anan
entaosnd ecomaind mediano com rigoso am
sistemacio uijniso laudo periculsoid de

...

[14:52]
Teste de arrumedos e de imiscuir
Entretanto, esclarecendo que a principal razão para a paisagem é
A! o cholumbrático.

[15:12]
Que palavra interessante...

[15:17]
Luminosamente, uma onda se arremessa ao seu destino.


[15:21]
Tenho uma pequena janela de notas
onde junto letras em palavras quase;
quase sempre diferentes
dos significados quase almejados.

Por trás, uma outra
e outra...
e outra...
se expandindo ao infinito.

[15:25]
Meu amor havia dito:
Tome cuidado com as más companhias.
Esqueceu-se, por um momento,
quem eu havia sido; sua má companhia.

[15:37]
Novamente, digito palavras vazias e letras desconexas
Pois outra pessoa passa e inspeciona,
o olhar, descuidado ou vil
perscruta o espaço onde me situo.

[15:40]
"A ciência me protegia daquilo que não queria saber."

[15:48]
O ser humano pode ser tão imbecil ao ponto de imitar um comportamento de outra pessoa. Ilude-se ao crer que este comportamento é sinônimo de segurança.
Resume-se a uma expressão de violência e força.

[15:53]
Mas afinal, é bem provável que para ele o necessário para viver seja justamente isso: agarrar-se a esta ilusão no seu enfrentamento diário do mundo da vida.

[15:54]
Tap tap tap... tip top tipo...
typo...
Não seria tudo um grande erro de digitação?
Não... não há projeto...

[16:14]
Prometo que é a ultima vez que finjo... hoje.

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Um dia...

Talvez eu consiga, um dia, revelar quão importante são certas coisas na minha vida.
Que só existem em sua plenitude.
Plenitude ilusória, diga-se de passagem.
Porque, no ínfimo, não há completude.

Se eu conseguir, eu me sentirei muito abençoado...
Porque hoje, eu ....

Obrigado LeRoi...

"It's always easier to leave, than to be left..."

"If I go
Before I'm old

Oh, brother of mine

Please don't forget me if I go
"


LeRoi Moore, 1961-2008


domingo, 3 de agosto de 2008

Se a foto fizesse o político...


Ele teria meu voto! =P

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Now playing: Dave Matthews Band - When The World Ends
via FoxyTunes

quarta-feira, 9 de julho de 2008

The unstable table and the infamous fable

É claro que seria muita pretensão minha entender o por quê da vida. No post anterior, defendi uma teoria de como tornar as coisas mais interessantes, de como tornar o seu quintal em uma planície vasta, em que houvesse uma ríquissima flora de onde poderiam ser obtidas muitos sabores, cheiros e cores.

Os que me conhecem percebem que há muito adoto uma postura agnóstica, tendendo ao ateísmo puro. Fruto, em grande parte, de minha formação acadêmica. Dificilmente eu poderia ter saído ileso daquele front, ainda mais imerso, com tanto prazer, em teorias várias, livros e pesquisas tão ímpares, tão eloquentes, tão ... elegantes.

Ainda mais se tratando da Biologia. Minha ciência é um meio termo entre ciências exatas e inexatas. Não possuímos, na maior parte das vezes, as ferramentas que podem nos dar o ponto crítico da prova em que apoiar nossas elaborações, ao contrário da física e a matemática. Mesmo assim, um dos grandes pensadores da humanidade emergiu de nossas fileiras. Darwin, que juntamente com Nietzsche, Marx e Freud, conseguiu desestruturar grande parte da história do pensamento do homem, atingindo de forma contundente suas bases (que foi tratado brilhantemente pelo meu amigo João Franco em um ótimo ensaio, intitulado "O Direito e os Golpes sobre o Narcisismo da Humanidade).

Peço desculpas pelo "meio de campo"... Na verdade, comecei a me perder com muita mais facilidade nos últimos anos. E é justamente sobre isso que eu tento escrever agora. Dentre as várias coisas importantes que me ocorrem, duas me têm tirado do prumo.

A primeira é que, talvez pela primeira vez na vida, eu estou com medo. Um medo grande do futuro. Medo por estar no controle da minha vida totalmente e não poder culpar mais a ninguém pelos "sucessos" e pelos fracassos (Ainda mais porque não defini o que é "sucesso" ainda). Medo porque não me sobra tempo para fazer o que gosto, (e sempre tive muito tempo sobrando) porque me arrisco em uma profissão que nunca pensei que poderia ser (e pra falar a verdade, sempre tripudiei). Mas não só isso.

Porque tive um sonho absurdo esses dias.

Eu sonhei que eu estava parado, talvez em um quarto escuro (meus sonhos são muito caóticos, mas me lembro bastante deles. Do que sobra, costuro...), e estava em pé. Olhava pra uma linha prata em uma tela escura , e essa linha ia se expandindo em várias direções, em vários ramos, uns mais grossos, outros mais delgados. Era uma grande sebe espinhosa que ia se expandindo infinitamente, pra onde ela pudesse preencher no campo neutro e escuro que era seu fundo.

E ali, eu reconheci um ramo destacado, que chamou a minha atenção... era uma linha bem delineada, que seguia vários horizontes, trilhava vários caminhos, contorcia-se e espiralava-se. Alargava... afinava... Até que parava... E depois de algum tempo, enquanto toda a trepadeira se diversificara o bastante, ela retornava o seu crescimento.

Confesso que não cheguei ao final do sonho, pois no meio dele eu reconheci que aquele fio destacado era a minha vida. Acordei com essa imagem na minha cabeça: minha vida e toda a vida do mundo. E quando me dei conta dessa alusão, só consigo me lembrar do tamanho inesgotável da trepadeira em comparação ao pequeno ramo que eu era.

É claro que é ridículo pensar assim ... É puro egocentrismo e narcisismo, querer abarcar todo o mundo, tentar compreender a totalidade da vida, sorver absolutamente o sentimento do mundo.

Mas isso me amedronta. Me amedronta porque não tenho projeto de mim perfeito e acabado, em que eu possa apoiar-me para lutar doravante. Ainda mais quando não tem como acreditar mais em um ordenador, em um provedor, algo superior que possa, se não escrever seu caminho, pelo menos auxiliar em algum momento mais difícil. Por muito tempo eu acreditei nisso, fui criado assim. Hoje, não é mais questão de pouca fé. A fé, esse novelo simbólico que trouxe a maioria das desgraças do mundo, junto com a ganância, não faz parte mais do meu vernáculo.

Eu consegui até hoje me desvencilhar de muitos problemas de minha vida com muita sorte. Os que não consegui e me arrebentaram, eu levo guardado muito fundo, mas não o bastante para que não consigam me atormentar em intervalos muito próximos de tempo.

Essa é a minha fábula infame.

O segundo dos meus tormentos últimos é como acreditar em qualquer tipo de ideal superior? Como desvencilhar dessa criação, dessa forma, dessa lama que sou eu e de onde eu emergi? Como esperar racionalidade onde a emoção e a paixão descontroladas clamam pelos fundamentos de sua infância?

Acima de tudo pra mim, o que antes poderia ainda ter de plano e apoiável, instavelmente desmoronou, como aquele grande bastião de pedra, martelado incessantemente pelos canhões de 24 polegadas de sua nobre majestade, foi reduzido a pó. Assim, mais uma das incontáveis chacinas da humanidade foi feita.

Refiro-me, antes de mais uma divagação, ao fato de que eu só pude conhecer o gênio do qual furto as palavras deste título e também sua imagem após sua morte. Só conheci Esbjörn Svensson depois que ele despediu-se no oceano. Depois de ler a notícia, corri atrás de seus albuns. Nem pude pagar por eles, pois alem de serem difíceis de se achar, era mais fácil procurar na internet.

Não pude prestar nenhuma homenagem a ele quando vivo. Não pude falar seu nome em bom tom em uma conversa de amigos antes que ele se extinguisse. Isso me entristece muito. E somente hoje a ficha realmente caiu.

E caiu de forma avassaladora. Pois hoje percebo que minha fábula infame está intimamente ligada à instabilidade da mesa em que jogo. E relembrando meu sonho, sinto medo e grande pesar por tudo que eu deixo de escapar e que seria maravilhoso pra minha vida.

E sei que não há como retirar estas características, estes adjetivos, sem perder uma grande essência do que fui e do que sou.

Portanto, se de alguma forma eu pudesse consertar algum erro plenamente, eu gostaria de iniciar pedindo perdão e prestando alguma homenagem a Esbjörn Svensson, que morreu aos 44 anos, abraçado pelo mar.

(e continuo a me perguntar: até quando sentirei saudade de tudo que ainda não vi?)

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Now playing: E.S.T. - Ballad For The Unborn
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sexta-feira, 27 de junho de 2008

razorsharp bubbles


É comum observarmos, no cotidiano, discussões acerca do sentido da vida, e como estas discussões inevitavelmente terminam encilhando os argumentos sob o manto de teorias várias: científicas, morais, religiosas, individuais, etc. A aparente manutenção do capitalismo-liberal democrático contemporâneo, pós-queda Muro, como o método realizado para direcionar economicamente a população humana transmite uma mensagem bastante clara e direta: a fórmula da melhor sociedade foi finalmente encontrada.

Não há mais necessidade de embates filosóficos. Decerto que o modelo ainda é falho, pois humano, mas só necessitamos de ajustar suas condições: pequenos reparos aqui e acolá e tornaremos a sociedade mais justa, tolerante, etc. Aparentemente, com o fim das utopias, não existem antagonismos suficientes para se neutralizar este modelo que, aos olhos do populacho, transmuta-se como o verdadeiro eldorado outrora sonhado. Necessário é trabalhar, receber, poupar, investir, especializar, e, se fores esperto o suficiente, teu assento olímpico está reservado.

Embora esta visão possua força descomunal, há alguns antagonismos muito fortes inerentes ao sistema que podem solapar tais instituições do pedestal onírico na qual situam-se. Há, entretanto, um grande porém: é necessário um grande estofo para que possamos, inicialmente, entender como funciona e qual o sentido da vida. É justamente aqui que podemos entrever um dos principais pulsares que emitem a episteme necessária para tal realização: o pensamento alargado.

Se algum dia eu pudesse humildemente escolher algumas palavras que definissem a espécie humana para um extraterrestre, esta palavra seria só uma: diversidade. Para todo e qualquer sentido, diversidade. Esta diversidade, que é uma característica da energia vital que nos anima e se dispersa pelo pequeno torrão de matéria que circunda a terceira órbita interna de nosso sistema solar, é início da discussão dos sentidos.

Diversidade: possuímos culturas diversas, que geram seres únicos, possuídos por espíritos deduzidos de pequenas estruturas distintas; indivíduos que ao trilhar o caminho inverso, do gene à humanidade, através de famílias, grupos, organizações, imitando a sua própria biologia (teorizada por eles mesmos), transformam toda a cultura e assim, ad aeternum se possível, seguem em mutação.

O antagônico da diversidade é a uniformidade. O uniforme enquadra, disciplina, apara, apresenta. A uniformidade trabalha mais efetivamente as forças a desiderato fim que o caos inerente à diversidade. Na esfera dos conceitos, dos sentidos, do pensamento, a afiada uniformidade imposta penetra e transforma as pessoas em portadores de discursos obsoletos e conceitos antiqüíssimos.

O crucial dos conceitos e discursos é que os mesmos realizam o sentido pessoal de cada um acerca de tudo, principalmente sobre o sentido da vida do portador. Deste modo, conceitos obsoletos e discursos antigos limitam o espírito do sujeito. Contido, o sujeito facilita o processo de dogmatização em sua vida, de sua energia; aprisiona-se a uma pequena, mas satisfeita, bolha de subsistência.

O antídoto a tal movimento é o que Kant, seguindo a linha de Rousseau, realiza com o conceito de pensamento alargado. O pensamento alargado poderia ser discorrido largamente. Por ora, seria necessário entender que o ânimo que procura expandir as fronteiras que limitam o indivíduo a todas as suas camadas presentes, rompendo com sua esfera segura de existência, irrompe-o no vazio, no caos, no novo, no descoberto. Transmuta de tal forma o sujeito que, ao tentar retornar à sua situação anterior, dificilmente se satisfaz com o pouco que ele possuía, o pouco que buscava. Descobre, de forma nietzscheana, os antigos falsos-ídolos e os despedaça defronte a si próprio.

Dínamo expansivo que alarga o pensamento e dilata diretamente o próprio sujeito que pensa. As amarras que ante seguravam-no desatam-se. Realizado e realizando-se, ele aprisiona agora novos conceitos e discursos, possui novos pontos de vista. Consegue, se não compreender, respeitar o outro e amar o Outro, estes símbolos que a psicanálise desvenda tão bem de nossos inconscientes. Criamos um laço empático, maximizamos nossa serenidade e a sabedoria.

Esta passagem do singular para o plural, das concepções ínfimas às mais amplas e complexas, atua afastando o sujeito de seu ponto de partida, sem contudo renegar a sua essência histórica individual. O verdadeiro espírito do mundo é aquele que consegue mudar permanecendo, em essência, o mesmo, agregando experiências e transcendendo a patamares cada vez mais altos em relação aos que não se aventuram e mantém, embora até com uma vida muito diversa, a cabeça e os pés no mesmo chão que nasceram.

Ascender a esta situação requer uma dose muito grande de busca e liberdade. Embora estes pressupostos, a liberdade e a possibilidade da busca, estejam hoje ao alcance de parte infinitamente maior do que estavam em tempos pretéritos, não observamos uma tendência de igual acréscimo à quantidade de sujeitos com espírito livre, sedentos a ampliar sua esfera de vida.
Trata-se, principalmente, do custo alto que é cobrado ao se alargar o pensamento: ampliando seu palco, nos é cobrado ao não se aceitar mais, com tanta tranqüilidade, dogmas.

Grande parte do sujeito é formada em épocas que nem consciência de si mesmo ele possuía. Ao assumir o leme, ele não sabe de quais madeiras foi feito seu casco; os cardamos da vela, são de cânhamo ou seda? As cartas marítimas que apontam tais ilhas, não estão invertidas? Deste modo, somente a experiência de velejar pode destruir concepções (os dogmas) já recebidas ao iniciar a viagem.

Concluindo, o pensamento alargado favorece a diversidade, tecido da existência, produzindo seres mais conscientes de si e dos outros. A vida pode ser expressa em toda sua amplitude possível, a esfera do existir se expande, o prazer é advindo é, imensuradamente, melhor. Este é meu ponto de vista sobre, entre tantos, como deve se viver a vida: a busca incessante de uma amplitude maior de experiências, sensações

Por último, duas observações (mais à guisa de questões): a diversidade não trabalhará a favor da uniformidade, ou seja, servindo de substrato para ser aprisionada em um novo modelo passível de mercantilização?

E ainda, em relação ao espírito alargado: tomando-se consciência da existência deste modo de viver mais amplo, serão muitas as pessoas a sair de sua segurança para trilhá-lo?

Dúvidas existenciais que, somente com o tempo, poderemos responder.



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quarta-feira, 25 de junho de 2008

Wu - Hsin

Cadê o sol que estava aqui? =)

quarta-feira, 4 de junho de 2008

\o/



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terça-feira, 13 de maio de 2008

F19.4 + F20.9

Caro Sr. Koppas

Encaminho as cópias dos prelados da lei em relação aos afetos que atingem toda a população alienígena. Lembramos que tais dados, embora revestidos de autonomia psicanalítica, desenvolvem se em um ambiente eutrófico único, possibilitando a evolução das espécies de conceitos metafísicos, que buscarão amparo melódico nas brumas cadavéricas das pequenas árvores.

Sendo assim, acima de tudo, primamos pelo reconhecimento da autonomia bicameral federativa das republiquetas empoeiradas, situadas ao ermo esquerdo de Rivendell. Não confundir com a ditadura ideática ao norte do Sino Divisor. Estas sim, podem ser consideradas como plenas defensoras totipotenciais da genética da pedra.

Ainda que as populações destas chapadas megalotróficas atenuantes possam ser considerados como detentoras soberanas das mangas-espada sauipenses, muita discussão enfoca-se no aspecto material-espirutualista do kafkianismo burocrático. Claro que nos posicionamos de forma peremptória a favor dessa negação positivista lírica, redacionista E expulsionista.

Outrossim, cremos, cientificamente baseados na ecologia dos besouros, da densidade apriorística zeppelin. Não obstante, quem nunca poderia sujeitar-se trompeticamente às milhas percorridas por eles?

Assim sendo, o embrião ambiental alcoólico herbáceo ressuscitará o prol de uma sociedade profundamente hemipartidade e bucólica.

É claro que tudo isso não passa de algumas boas observações fundamentadas de maneira responsável que visam, eticamente, à finalidade única da sublevação harmônica próprio-senciente. Por isso, caro amigo de copas, tenha isto como verdade fé certificada para sua vida besta.

Ou seria o contrário ?

Haikai do Instante

Também pensando
"estas coisas não ocorrem"

Ocorreram.

De pronto,
sem momento
de antecedência.

O instante:
permutou sua essência da eternidade
pela existência no presente.

sexta-feira, 9 de maio de 2008

Political Compass

Há muito tempo atrás, e falo sério, já que acabo de ler uma reportagem em que falam que "na segunda metade dos anos 90, o ICQ era o MSN e hoje não passa de peça de museu da internet", uma das coisas mais legais da internet eram aqueles testes que você fazia e falavam com o que você parecia (um animal, um personagem de um livro, um carro, um artista etc).

Bom, acho que isso ainda existe não é. Eu é que não faço mais =D

De qualquer modo, esbarrei em um bem legal (confesso que gostei bastante do resultado). Chama The Political Compass e faz uma troça com seus ideais politico-sociais. Não é fácil manipular o resultado, algumas perguntas são capciosas, o que dá uma boa idéia de seu "alinhamento".

Bom, meu resultado saiu assim:


Assim, um libertário de esquerda? Quê isso, o menino nem anarquista é =P

Na página eles ainda tem uma comparação com alguns dos atuais líderes políticos e como você se sairia perto deles.
Dalai Lama? Sério, gostei desse brinquedinho!

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Free Tibet

Free Tibet

terça-feira, 29 de abril de 2008

Koan

O monge Nagarjuna era um grande conhecedor do buddhismo. Certa vez, seu mestre, Kapimala, ganhou uma jóia preciosa de outra dimensão, do reino das nagas.

Nagarjuna: Esta jóia, brilhante e mágica, tem forma ou não?
Kapimala: Você ainda está obcecado por dualismos, "com forma" e "sem forma". Por que você não percebe esta jóia diretamente? Ela não tem forma, nem é sem-forma. Além disso, ela nem mesmo é uma jóia.

Nagarjuna percebe a forma da não-forma, a jóia que não é uma jóia, e realiza o caminho.

(...)

Tenho que estudar...
Tenho que trabalhar!
Tenho que viver.

Energia que se expande e se contrai alucinadamente.

absorve ...
... EMITE!

Sou.

Consciência momentânea.
Que trafega
entre a montaria
e o cavaleiro.

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quarta-feira, 9 de abril de 2008

Dona Divina

Dona Divina.

Quente. O ar condicionado não funciona direito. ‘Quinze pras quatro’ de uma tarde modorrenta de quarta-feira. Fome. Mas ainda assim, tranqüilo, sereno. Estudando Direito Penal. “O princípio da diginidade da pessoa blá blá blá...” Soa como ironia.

Ela entra.

“Boa tarde. Gostaria de falar com o Belém.”
“O Dr. Belém só atende às quintas e às segundas. Amanhã ele estará aqui. Eu posso te ajudar?”
“É que eu gostaria de saber por que meu filho teve pedido de semi-aberto duas vezes mas não sai daqui.”

O Dr. Belém é visto como responsável por muitos ficarem, não “passarem” no Exame Criminológico, mas isso é cotidiano. Se existem heróis nessa m* de mundo, o Dr. Belém é um deles. Peço o nome do filho, olho o prontuário, leio para ela as conclusões do último laudo, explico que o laudo dele foi razoavelmente bom e que ele poderia ter saído. Mas já me lembro e pergunto:

“Qual foi o delito (eufemismos....) dele?”
“Latrocínio.”

Engulo seco. Tudo que não gostaria de ouvir. “Latrô”. 157, §3. Crime complexo, que envolve tantas variáveis e componentes quanto grãos de areia nesse mundo. É claro que você pode simplificar as coisas, reduzir, rotular o “delinqüente”, dizer que é desumano... O Bush também comanda a América e quase o mundo, a desigualdade social reina galopante, e nem por isso as coisas certas são feitas ...

Negra. Cansada. Olhos marejados, mas ela não chora. As lágrimas teimam em tentar sair, mas ela não chora. Fica em pé. Altiva. Pobre. Apanhou muito nessa vida. Já sofreu demais. O sofrimento humano não tem limites.

Como explicar a esta senhora que , em se tratando de latrocínio, há uma notável resistência por parte da ‘justiça’ goiana de conceder a progressão? Que, embora não seja comum, há laudos que são bons e que os presos não a tem? Como dizer as palavras mais simples: “Senhora, seu filho está f*...”

“Moço, é que ele caiu com 18 anos, estava com emprego arrumado de garçom; foi no final de semana, no início da semana ele ia trabalhar. Há oito anos que eu puxo cadeia com ele. Todo domingo eu to aqui. Eu sei que ele tem que pagar, mas ele também tem que sair. Ele perdeu a juventude dele toda aqui.”

“Eu sei Dona Divina” é o que eu penso e falo. Concordo com ela. Tento reconfortar. Mas como reconfortar alguém que vive oito anos de prisão, sem estar presa? É claro que ela desconhece um princípio basilar do Direito Penal, constante no artigo 5º da Constituição Federal, em seu inciso XLV: “Nenhuma pena passará da pessoa do condenado”

Como fica bonito assim, escrito, na Constituição...

Oito anos de prisão para esta mãe, e bem possível mais. A possibilidade de ele sair é mínima. Tento manobrar as palavras, não me dou nada bem com a esperança, e não posso dá-la nunca a alguém que tenho absoluta certeza que já a perdeu e não quer reencontrá-la. Tento não ser incisivo, tento “levantá-la”, tento dizer dos meios jurídicos possíveis para contornar esse impasse...

Tento...

“Moço, é que ele só errou uma vez moço. Era novo. Agora, ta usando droga, tá mudado. Ele é um menino tão bom. Eu que sou mãe eu sei; eu vejo ele todo domingo, converso com ele. Falo pra ele ficar bem. Mas ele não fica. E não sai daqui.”

Converso longamente com ela. Peço pra que ela volte amanhã, para conversar pessoalmente com o Dr. Belém, ver o que ele poderia fazer. Mas eu o conheço. Ele nunca iria mudar um laudo para ajudar qualquer que seja. Sempre ético. O que ele vê, está ali. É a vida dele que está no documento.

Dois heróis. Dona Divina e Dr. Belém. Antagonismos.

Ela sai pela porta de minha saleta.Os grandes olhos negros marejados.
E o pior que ela não chora.

Eu? Choro todo o caminho de volta para casa....


“Pick me up, love, from the bottom.... to the top love...
Everyday...”

quarta-feira, 2 de abril de 2008

Dreams

Como se tranqüilamente houvesse entrado em meu sonho... vívido. Vozes serenando, a música transmutando-se e a neblina, que outrora partilhava comigo sua existência, num par íntimo indivisível, dissipou-se.

transcendência ...

Ali, o passado assomara no presente: olhares a lugares que nunca visitei me acertavam com tamanha intensidade que, instintivamente, dobrei meus joelhos... Estive certo de que o golpe que separaria minha cabeça, tamanho peso que carrego, de meus ombros estava próximo. Recolhi-me em meus pensamentos e aguardei...

não veio...

Como tudo que não veio durante minha vida e eu aguardara ansioso
Minha faculdade ficou no lugar, e meus demônios tornaram a me espicaçar,


Imóvel. Ruminando a constante inércia em que me aprisiono. O eterno ciclo do alarmar/acalmar. Excitação. Ausência. O estímulo que, omisso, foi rememorado em longas e calmas tardes de domingo.

Por baixo das camadas:
folhas,
papelescos,
papelotes e
perfidez


A certidão carcerária ...
Ausente?
Certificado e com fé!

Um passo para sair deste sonho. Um mísero passo atrás. Ou a frente, quem saberia dizer se o momento não o era?

Enquanto todas estas sensações perpassavam aquele indivíduo, o corpo suando indiferente à mente, o espírito atravessara a ponte e foi brincar nas piscinas douradas do pôr-do-sol.

Onde, os campos de trigo; carreados pelos bicos dos pássaros, açoitados pelos humildes fazendeiros: grãos se perdem entre a paisagem metodicamente geometrizada dos tablados de plantações.

As pequenas casas à beira-mar, com roupas estendidas, alvas, em varais improvisados nas janelas, onde por fundo, o monte nevado observa...

sabiamente,
agredido,
mutilado,
sozinho....

quinta-feira, 6 de março de 2008

Lee Miller - Photo

30th April 1945
Lee Miller, Dead German soldier floating in canal Dachau, Germany


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sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Abismos - Parte II

A cada dia, mais e mais notícias sobre a situação calamitosa da "segurança" no país e, em especial, nosso estado. Espocam flashes sobre execuções, grupos de extermínios, estupros, assassinatos cruéis, montantes infindáveis de drogas apreendidas e mais e mais a contagem de corpos chega a números assustadores.

Em Goiás, estamos atravessando por períodos turbulentos. A mídia goiana, seguindo a postura das tendências da mídia nacional, cada dia reserva mais espaço para o noticiário policial. Com o aumento da atenção sobre o sistema prisional do estado, mais e mais absurdos vêm à tona (casos como o das mulheres e adolescentes presas no Entorno, os grupos policiais de extermínio, dentre outros). Estas realidades, que em nenhum momento desaparecem se não estão em voga na mídia, pré e pós existindo após o circo midiático, denotam a sistemática violência e as torturas do mundo atual, o que pode contribuir de modo positivo para a mudança das instituições goianas.

Ocorre que a postura questionadora do "por que" de tudo isto não ocorre, de ambos os lados, do que articula e do que recebe o discurso. Do ponto de vista da mídia, ela tem a dúbia postura "neutra" na transmissão dos fatos. Do lado oposto, os receptores não denotam nenhuma postura cética ou crítica ao discurso que recebem, situando-se como ponto final de um caminho que deveria ser de mão-dupla.

A questão se torna cada vez mais complicada quando entram em jogo as posturas do Executivo (responsável pelas cadeias e acatar as ordens) e do Judiciário (o famoso "quem manda prender"). O primeiro, sempre caduco por falta de verbas, dá as mais variadas explicações (licitações estão em andamento, isso não é isso, é aquilo etc) que não deixam de ser verdade pois a burocracia ata tudo e todos em um mundaréu de amarras e algemas. Já o Judiciário, isolado da realidade, em seus palácios e tribunais esplendorosos, também reclama de falta de recursos (humanos, diga-se de passagem). E assim, cada qual vai lutando neste palco.

O que eu continuo nao concordando, em hipótese alguma, é com a postura do Judiciário na questão. Lendo hoje o jornal O Popular, vejo que os juízes do Entorno dizem que a situação é calamitosa, a prisão faliu, não recupera, reeduca ou retorna o indivíduo a sociedade (coisa que ouvimos desde o início da instituição), etc mais etc mas lembram que a superlotação nas cadeias é responsabilidade do Executivo.

Oras, com todo o sistema de penas alternativas, se houvesse bom senso dos juízes , deixassem esta mentalidade tacanha e agrária desse estado bunda que a gente vive, uma grande parte das pessoas nem passaria na porta da prisão. Jogar a culpa nas mãos do Executivo é passar a bola pra frente e nada acontece. O Judiciário necessita de uma postura ativa neste processo. Esse jogo de empurra empurra nada leva...

Mas há outro porém. A Lei de Drogas (Lei nº 11343/06) veda absolutamente a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos (penas alternativas), alem do tráfico ser considerado crime hediondo (como se colocando um rtulo algo mudaria). Acontece que muitos vão parar pela primeira vez na porcaria da CPP e depois no Cepaigo com o que? 18, 19, 20 anos, porque traficaram uma quantidade de drogas que as vezes é absurdamente ridícula. Às vezes 3 anos, 3 e meio de condenação (perfeitamente substitutível por uma restritiva de direitos).

Ocorre que quaisquer 7 meses dentro do Inferno o torna um demônio...

Lasciate ogne speranza, voi ch'intrate

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quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Bushido


Ato IV, Cena II


Caminhava há muito tempo sem olhar para trás. A cabeça baixa, os olhos percorrendo as folhas, a terra, o musgo que permanecia como há séculos assentado por sobre as árvores. A folhagem bailava ao som da música invisível orquestrada pelo vento; entrava pelas copas das árvores e percorria, do alto até o chão úmido, o caminho que os espíritos fazem quando vêm às florestas, em noites estreladas, para resolver suas pendências de vidas passadas.

Melquíades, absorto, não percebe desta vez a presença do Diabo. Este olha aquele de longe, inquirindo sobre as razões de sua absoluta crença da proximidade do fim. Perscruta os pensamentos de Melquíades, e encontra uma confusão de certezas e dúvidas, como se existissem dois entes ou mais dentro daquele corpo.

Enquanto caminha, Melquíades sabe que o fim está próximo, palpável. Lembra-se dolorosamente dos odores e nuances do início da sua vida, agora que já não os percebe com facilidade. Sua respiração é difícil, sua garganta constringe seus pensamentos e, muitas vezes, sua visão. Quando se cansa, ele apóia-se em uma árvore, sua mão percorrendo e tateando os pequenos ramos do musgo que ali habita. Pressionado pelos dedos, o musgo percebe a triste energia incontida de Melquíades que flui para si, e sente pena do humano.

O Diabo atrás vai, sem alarde, a uma distância segura. Alcança a aura pensativa de Melquíades, e sussurra em seu pensamento: “Meu filho, é natural estar com medo”. Melquíades se conforta por um instante. Imagina que seus receios são infundados, e expulsa, mais uma vez, a sombra que ronda o seu eu, para longe. Sente um frio percorrer seu braço, apoiado a árvore. Olha o tronco da castanheira centenária de cima a baixo. Imagina esta árvore nascendo, sua luta por entre as folhagens, os insetos que a devoraram, a busca pelo sol, suas raízes penetrando mais profundo do solo arenoso da floresta a cada dia, esforçando-se para encontrar a água da vida.

Percebe que a aquela árvore viveu toda a história de sua floresta, sua colina, os murmúrios do córrego que descia mais adiante (Melquíades também o ouvia) que banhava suas raízes indiretamente. Ouvira cantos de centenas de gerações dos mais variados e lindos pássaros, o pio noturno do bacurau, o grito dos gaviões de rapina, o encanto da dança dos tangarás. Sabia que aquela árvore conhecera muitas irmãs que tombaram em tempestades ou acometidas por doenças, vira muitas nascerem e agora buscarem o alto do dossel para se espraiarem nos raios solares.

Ele então soube da imensa distância de seu conhecimento e de seus valores. Soavam mesquinhos ao lado do ser centenário que assomava a sua frente. Melquíades prostra-se e chora baixo, silencioso, como que respeitando a música daquela floresta.

A castanheira desperta de seus sonhos de árvore com o incômodo de algo à sua raiz e olha abaixo. Vê o que parece ser um primata. Não... engana-se, é um daqueles seres humanos que por aqui são, graças aos deuses ela reflete, tão raros. Já ouvira falar das lendas destes pequenos, que habitam algures pelo mundo, de pequenas mãos segurando objetos violentos que rasgam e sangram os seus até a morte, desnudando a face da Mãe até deixá-la irreconhecível.

A princípio, olha com rancor e ódio. Mas então capta todo o sofrimento do animal. Embora se gabe da sua racionalidade e de seu progresso, vive aprisionado pelos seus medos e pesadelos, a vida com maestria regida por superstições da sua ciência quando muito, pois a maioria vive na fé cega das religiões que nunca foram os melhores exemplos de compreensão e compaixão. Habitam pequenas covas que entulham de coisas sem importância, enquanto se matam para manter um estilo de vida que aos olhos de todos é infeliz, roto, vazio, estúpido e auto-destrutivo. Invejam-se, ó sim, como se invejam dos outros e deles mesmos, e vivem numa eterna incompreensão consigo e com seus pares. A castanheira, ao final, sente pena de Melquíades.

O Diabo está parado. Sabe o que a castanheira e o caminhante pensam. A primeira tem compaixão do segundo. Este, ao contrário, está imergindo lentamente em sonhos densos, nublados, sem esperança. Espera até que o pequeno sujeito aos pés da árvore respire mais profundamente. Vê-o enrodilhado como um cão de rua, ao abrigo das raízes tabulares, e lentamente penetrar no interior do mundo dos sonhos mais profundos.

Só assim Ele se aproxima...

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Bares - Fratelli Pizzaria

Inaugurando mais uma seção do blog, vou começar agora a avaliar os bares e restaurantes que eu vou (novamente, minha pretensão me derruba!). Na verdade, é mais uma forma de compartilhar experiências e não esquecer das coisas!

Fratelli Pizzaria
(Endereço: Av. T5, esq. com T65, St. Bueno)

A Fratelli substituiu (com muita tristeza e pesar) um dos melhores botecos que eu já fui em Goiânia, o Dr. Cevada. O Dr. Cevada tinha o melhor torresmo da cidade (sem igual, vinha quentinho, crocante, nada parecido com estes "baconzitos" que encontramos pela cidade), com muita carne de porco em uma porção muito bem servida a cinco reais! Fora dizer que, após derramar um caldinho de um limão bem suculento, ele crepitava a alto e bom som. Sem dúvida, já passei momentos espetaculares no Dr. Cevada (que o diga o Aldão com sua dor de cotovelo heheh)!

Prós: Não cobram 10% (A Bohemia está aceitável a R$4,00). O cara, que eu acho que é o dono, parece o "Dr. House" e a pizza, dizem as más línguas, é boa.

Contras: A variedade de petiscos é nula e cara. O bar é vazio (se bem que isso é um elogio pra mim). O espetinho é muito caro, com pouco acompanhamento. Em suma, eu espero que nunca mais eu volte lá =D

Nota: 4.5

Ah... que saudade do Dr Cevada....

segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

Michel Foucault – Parte I

“Não me perguntem quem eu sou e não me digam para continuar o mesmo: esta é uma moral de estado civil.” Michel Foucault

Em 1975, o jornalista e escritor francês Roger-Pol Droit entrevista seu conterrâneo Michel Foucault. Foucault, à época, já é lenda. Uma incógnita, a descontinuidade enfeixada em uma personalidade única e multifacetada, pertencente a e, por que não, a liberdade por excelência. Foucault acabara de publicar Vigiar e Punir, um dos seus livros mais conhecidos e, nesta série de três entrevistas, disserta, expõe-se, esconde, brinca, joga a respeito de seus pensamentos, literatura e sua vida e obra, numa das raras vezes em que Foucault se sente a vontade para falar sobre si. Estas entrevistas são reunidas e publicadas por Droit no livro Michel Foucault, Entrevistas (Editora Graal, 107 páginas). A introdução feita pelo autor do livro é uma pequena obra de arte. Versa sobre o sujeito principal de uma peça, a sua própria vida, encenada com violência e paixão, nas palavras de Droit:

“Uma criança frágil se entedia entre duas guerras em Poitiers, em meio á vida abastada de pessoas eminentes como são as da sua família e, notadamente, seu pai, cirurgião e professor de anatomia na Escola de Medicina. Um aluno muito dotado vai para o liceu Henrique IV preparar-se para a Escola Normal Superior. Em 1948, um estudando da École Normale Supérieure, homossexual e membro do PCF tenta suicidar-se e parece beirar a loucura. Um filósofo apaixonado por psicologia, abandona a Fundação Thiers pela Universidade de Lille. Na Suécia, um adido cultural surpreende a pacata cidade de Uppsala dirigindo um jaguar. Ao voltar de Hamburgo, via Varsóvia, um jovem médico, dândi feliz e provocador, ensin em Clermont-Ferrant. O anti-comunista trava uma disputa com Roger Garaudy. Um membro do júri da École Normale d’Administration, participa da elaboração da reforma Fouchet.
Todos eles se chamam Michel Foucault...”

Sua vida e obra, absurdamente caóticas, prolíficas e descontínuas, foi interrompida pela Aids em 1984, aos cinqüenta e sete anos. Muito pouco se sabia a respeito da doença à época (o vírus fora descoberto em 1983 pelo Institut Pasteur), e Foucault guarda a triste memória de ser um dos primeiros casos “célebres” a falecer.

Abaixo, um excerto deste livro, o que mostra a clareza e o brilhantismo das idéias de Focault. Os grifos e itálicos são uma petulância minha.

" Dos suplícios às celas"

Supliciava-se (o corpo) com aplicação, seguindo um código preciso de torturas. Marcavam-se, amputavam-se, deslocavam-se corpos. Da fogueira ao patíbulo, do pelourinho à forca, o sofrimento físico era encenado com um fausto exemplar. Para que ninguém o ignorasse... Tudo isto chegou ao fim, de modo bastante brusco, na segunda metade do século XVIII.

O barulho monótono das fechaduras, a sombra das celas ocuparam o lugar do grande cerimonial da carne e do sangue. Não se exibe mais o corpo do condenado:ele é escondido. Não se quer mais assassiná-lo: ele é adestrado. É a “alma” que é reeducada.

A mudança ocorreu em menos de um século, no conjunto da cultura ocidental. Certamente, a Idade Média não ignorava os cárceres nem as masmorras. Porém, continuava estranha a este sistema rígido de detenção sistemática, regulamentada, minuciosa, que se estabelece entre 1780 e 1830: a Europa e o Novo Mundo cobrem-se de penitenciários... A este “nascimento da prisão”, Michel Foucault restitui o sentido e o alcance.

Basta dizer, com os “reformadores” do século XVIII (Beccaria), que a “humanização”, os “progressos do gênero humano” explicam e justificam este transtorno do sistema punitivo? Por detrás dos álibis dos ideólogos, Foucault desnuda o jogo complexo dos poderes.

O estardalhaço dos suplícios e o silêncio da reclusão não se opõem, com efeito, como dois elementos isolados, dois fenômenos superficiais. Indicam, sim, a passagem de uma justiça a uma outra, uma mudança profunda na própria organização do poder. O criminoso, na monarquia absoluta, desafia o poder do rei e este poder o esmaga lembrando a todos, com estardalhaço, sua força infinita. para os teóricos das Luzes, o homem que comete um crime rompe o contrato que o liga a todos os seus semelhantes: a sociedade pó afasta e o adestra, regulando com precisão cada fato, cada gesto e cada momento da vida carcerária.

Pois a prisão é uma regulamentação feliz do espaço: o olhar do vigia pode e deve tudo ver. Uma regulamentação do tempo, cuja utilização é fixada a cada hora. Uma regulamentação dos gestos, das atitudes, dos mínimos movimentos do corpo.

Esta disciplina, a prisão não a inventou. Com um luxo de referências e de documentos, Foucault mostra como, durante toda a Idade Clássica, as técnicas de adestramento do corpo foram refinadas, unificadas, sistematizadas. Elas já existiam, esparsas, isoladas. Mas não formavam esta rede de procedimentos aperfeiçoados que, da escola às Forças Armadas, passou a controlar o corpo e suas forças.

A prisão, não é, então, única: ela se estabelece no conjunto da sociedade disciplinar, esta sociedade de vigilância generalizada que é ainda a nossa. “O que há de surpreendente, escreve Foucault, se a prisão se assemelha às fábricas, às escolas, às casernas, aos hospitais, que todos eles se pareçam com as prisões?”.

Para compreender sua organização comum, Foucault esboça nesse livro uma “anatomia política”, uma “microanálise” da ação de poder sobre os corpos. Como se organiza, na prisão e fora dela, o jogo dos poderes? É o que esta entrevista, entre outras, torna preciso.

Roger-Pol Droit: A prisão, em sua função e em sua forma contemporânea, pode passar por uma invenção repentina e isolada, ocorrida no final do século XIX. Você mostra, ao contrário, que seu nascimento deve ser realocado numa mudança mais profunda. Qual?

Foucault: Ao ler os grandes historiadores da época clássica, pode-se ver o quanto a monarquia administrativa, tão centralizada, tão burocratizada quanto a imaginamos, era, apesar de tudo, um poder irregular e descontínuo, deixando aos indivíduos e aos grupos uma certa latitude para burlar a lei, para se acomodar aos costumes, deslizar entre as obrigações,etc. O Antigo Regime arrastava consigo centenas de milhares de ordens jamais aplicadas (lettres-de-cachet, As verdades e as formas jurídicas), direitos que ninguém exercia, regras às quais massas de pessoas escapavam. Por exemplo, as fraudes fiscais mais tradicionais, como também o contrabando mais manifesto, faziam parte da vida econômica do reino. Em suma, havia entre a legalidade e a ilegalidade uma perpétua transação que era uma das condições de funcionamento do poder nesta época.

Na segunda metade do século XVIII, este sistema de tolerância muda. As novas exigências econômicas, o medo político dos movimentos populares, que vai se tornar lancinante na França, depois da Revolução, tornam necessário um outro esquadrinhamento da sociedade. Foi preciso que o exercício do poder se tornasse mais fino, mais estreito, e que se formasse, desde a decisão tomada centralmente até o indivíduo, uma rede tão contínua quanto possível. Trata-se do aparecimento da polícia, da hierarquia administrativa, da pirâmide burocrática do Estado napoleônico.

Já bem antes de 1789, os juristas e os “reformadores” haviam sonhado com uma sociedade uniformemente punitiva, onde os castigos seriam inevitáveis, necessários, iguais, sem exceção nem escapatória possíveis. De repente, estes grandes rituais do castigo, que eram os suplícios, destinados a provocar efeitos de terror e de exemplo, mas aos quais muitos culpados escapavam, desapareceram diante da exigência de uma universalidade punitiva que se concretiza no sistema penitenciário.

Roger-Pol Droit: Mas por que a prisão e não um outro sistema? Qual é o papel social do confinamento, do enclausuramento, dos “culpados” ?

Foucault: De onde vem a prisão? Responderei: “Um pouco de toda parte”. Houve uma “invenção”, sem dúvida; mas invenção de toda uma técnica de vigilância, de controle, de identificação dos indivíduos, de esquadrinhamento de seus gestos, de sua atividade, de sua eficácia. E isto, desde os séculos XVI e XVII, nas Forças Armadas, nos colégios, nas escolas, nos hospitais, nas oficinas. Uma tecnologia de poder fino e cotidiano, do poder sobre os corpos. A prisão é a última figura desta idade das disciplinas.

Quanto ao papel social do internamento, é necessário buscá-lo do lado deste personagem que começa a se definir no século XIX: o delinqüente. A constituição do meio delinqüente é absolutamente correlativa á existência da prisão. Procurou-se constituir, no próprio interior das massas populares, um pequeno núcleo de pessoas que seriam, por assim dizer, os titulares privilegiados e exclusivos dos comportamentos ilegais. Pessoas rejeitadas, desprezadas e temidas por todo mundo.

Na Idade Clássica, ao contrário, a violência, o pequeno furto, a pequena fraude eram extremamente correntes e, afinal de contas, toleradas por todos. O malfeitor conseguia, ao que parece, fundir-se muito bem na sociedade. E, se lhe acontecesse ser preso, os procedimentos penais eram expeditivos: a morte, as galés para o resto da vida, o banimento. O meio delinqüente não tinha, então, este fechamento sobre si mesmo, que foi organizado essencialmente pela prisão, por essa espécie de “molho” no interior do sistema carcerário, onde se forma uma microssociedade, onde as pessoas encetam uma solidariedade real que vai lhes permitir, uma vez fora, encontra apoio nos outros.

A prisão é, então, um instrumento de recrutamento para o exército dos delinqüentes. É para isto que ela serve. Fala-se, há dois séculos: “A prisão fracassa, pois ela fabrica delinqüentes”. Eu diria, antes, ela é bem-sucedida, pois é isso que se lhe requer.



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quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

"A estrada só existe quando a percorremos."

Querido primo:


"A estrada só existe quando a percorremos." Esta é, por certo, uma frase que guarda ressonância com muitas outras que tratam do mesmo tema. Na verdade, até parece que foi dita várias vezes ao longo da história e literatura humana, em todos os cantos que trouxeram o tópico à tona. Eu humildemente a lancei mão na viagem que eu e minha namorada fizemos no final do ano para passarmos o reveillon na magnífica Pirenópolis.


Saímos de Goiânia à tardinha, aproveitando ainda a iluminação natural do sol nos dias longos de nosso verão. Ainda estava claro quando saímos, o escurecer só chegando após as sete e meia, sete e quarenta. Em uma das curvas mais acentuadas, já com bastante chão andado, ponderei sobre como gostava de dirigir a noite, e percebi que as sombras e os contornos difusos projetados pela luz oblíqua do entardecer, ao invés de incutir temor, transformavam a paisagem, que há muitos poucos minutos era definida e previsível, em algo um tanto

pastoso, intrigante. E o que mais apreciei era a curiosidade crescente em mim sobre o que poderia vir após as curvas, retas, montes e baixios.


A estrada só passou a existir para mim quando a percorri. Embora fosse uma estrada traçada há muito tempo, bem asfaltada e segura, a mim era um risco em um mapa de Goiás ou uma imaginação ao pé de uma boa conversa, uma leitura. Ela não tem nada de espetacular ou um ponto cardeal, somente um caminho que corta o espaço geográfico de nosso Estado entre duas cidades, a capital, e a do interior. Cidades, fazendas, plantações e rios. Uma pequena estrada que me trouxe uma das maiores realizações que já tive.


Tudo isto grandemente influenciado pela leitura do clássico On the Road, de Jack Kerouac, edição de bolso, da L&PM que você já te recomendei. Um dos símbolos do inconformismo da geração anos 60, em um tom autobiográfico, a lenda nos conta como Kerouac escreveu o livro tomado por um "fluxo de consciência" em três semanas, datilografados em um rolo de papel de 40 metros de comprimento, em espaço único, sem parágrafos, de maneira musical, devendo ser lido em voz alta, com alternâncias poéticas e rimas que somente no original brilham em toda a sua loucura e vivacidade.


Sei que você gosta de História, então lá vai um cadinho. No período pós-guerra, onde a cultura dominante lutava para reassumir as rédeas, sentindo que o mundo caminhava cada vez mais para o conformismo e esmagados pela repressão psicológica da "lei e ordem", surgiu, o que alguns denominam a primeira como a primeira forma de sub-cultura, entre muitos movimentos de contestação, a Geração Beat. Tanto podemos utilizar o termo para nomear o grupo de escritores que iniciou o movimento quanto para denominar o movimento que eles detonaram. Estes prezavam por uma existência mais dionísica, improvisada, caótica, enfim, "contracultura". A vida que você sempre quis levar mas teus pais não deixam.


Muitas pitadas de jazz (por excelência o estilo musical do improviso), bebidas e drogas; prezando pelo retorno à humanidade sincera e afetiva; ao calor dos corpos:


ao sexo como forma de expressão e liberdade...


todos estes fatores aliados à mais pura sinceridade e alegria de existir deflagraram o início da revolução cultural dos anos 60, um dos temas mais fascinantes da História do século XX e que modificou todo o curso do que viria, principalmente o Rock. Este é o tipo de livro que se ama pela descrição e pela musicalidade, pela loucura, pela alegria, pelo simples prazer de ler. Embora longe de ser uma unanimidade, visto que o modelo de vida pregada é totalmente incompatível com a cultura mainstream e os valores de grande parte da cristandade ocidental, aos de espírito livre certamente agradará, como você. O primeiro do ano!


Ao ano de 2008, saúdo os novos caminhos e oportunidades que certamente nos serão mostrados. Espero que nos esforcemos mais para retirá-los do mapa e transformamos em estradas percorridas. Pois só assim elas, de fato, existirão.


Ps: Meu amado primo, já é 22 de janeiro e terminei o terceiro livro do ano. A Jangada de Pedra, de José Saramago e Felicidade, de Eduardo Giannetti são congruentes? Veremos! Até a próxima carta, e me escreva constantemente. Um abraço.

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