quarta-feira, 4 de março de 2009

"Picanha sem gordura é heresia"

Lento, deslizo por sobre a superfície. Caminho como que se pisasse em ovos. Ao entardecer, começo o filme. 'Análise sócio crítica da sociedade classe média' e 'cinema verdade' como pilares da minha película.


Aí penso assim ó: fodeu.

Uma coca-cola, um cigarro. As coisas se aplainam na cabeça. Saciada a fome, conjecturo sobre o dever ou a paixão. Ah pensei-me: simbora!

Aí eu vi: que furada me meti.

Rio de Janeiro, 1965, após o golpe militar. Jabor detonando a classe média e se detonando no filme. Vários cigarros e contratempos mundanos no caminho. As coisas iam e viam, uma loucura de viagem. Mas caba o filme.

Caramba, que treta.

Vai pra rua para navegar. Se perde no mar de gente, nos pequenos circulos de amigos ao entardecer, os notívagos, os bêbados, trabalhadores ou vagantes, os últimos como o narrador: todos compartilhando de alguma maneira largas golfadas de vida.

Desço para comprar uma coca, acabo ganhando muito mais: magníficas emanações humanas. Captadas devidamente com os sentidos; porquê achas que culinária só é culinária se feita com sentidos, e não com receitas?

Dialogando consigo mesmo, assim caminha o que é, ainda, eterno vórtice de loucuras. Sente-se tão feliz que poderia embarcar tudo e todos. Relembra as coisas mais belas, adora as coisas ainda tão gostosas.

Quando sente que é hora de se sentar e tentar permanecer, de alguma maneira, ainda mais lúcido, vai buscar uma coca-cola e um cigarro. Quando tudo está indo de novo pra cima...

Nóia.

2 comentários:

Gabs disse...

Ficar um bom tempo sem comer uma suculenta picanha já é uma heresia! Falo por mim, mesmo... Não comê-la é um sofrimento tão grande ou maior do que comer e "entupir" nossas coronárias desse prazer! Aliás, como são bons esses "pequenos pecados" que cometemos no nosso dia a dia... Nos sentimos um tanto mais imperfeitos e, assim, bem humanos... Afinal, o que seria da picanha se não fosse aquela gordurinha, não é mesmo? :***

Luiz Alfredo disse...

Meu amigo gabo!
Este eu considero o post mais enigmático do ano!
E estás completamente com razão: o que seria da vida sem o sabor?