Era segunda feira e eu tinha acabado de sofrer na cadeira do dentista uma tortura inigualável (hmm... mentira, mas fica mais dramática a história). Aturdido e padecendo de dores, comecei a pensar com os meus botões: o que fazer naquela noite? Já estava de férias e sem a faculdade, mais tempo sobra para estes pequenos prazeres. Minha namorada chegou com uma brilhante idéia: vamos à loja de vinhos que abriu na esquina!
“Opa, alto lá cara-pálida... vinho?”. De vinho eu só tenho ciência dos litros e garrafões que já entornei quando era moleque e ficava ouvindo música e tocando violão com os meus amigos, debaixo do pé de manga na casa do Raphael. Em suma, sou um zero à esquerda nesta arte tão requintada da enologia. Peçam-me uma sugestão de vinho e eu devo falar algo como “Mas com essa grana você compra 2 caixas de Bohemia!”. É mais ou menos assim.
“Hmm... boa idéia. Vamos lá, vamos ver se consigo enfim gostar tanto de vinho como eu gosto de certeza.” Dá para perceber que seria mais uma perdição na minha vida. Mas como eu gosto do mal-feito, me vesti e fomos à loja.
Sempre me lembro do Sideways – entre umas e outras (continuo me surpreendendo com a criatividade das pessoas que traduzem os nomes dos filmes... só a Polícia Federal consegue superá-los com o nome de suas operações.), um filme que eu acho horrível e entediante, mas para os conhecedores e amantes da bebida deve ser muito bom. Até tentei compreender e apreender sobre as variedades de uva essas coisas, mas não consegui.
A noite prenunciava-se fria e perfeita, já que no DVD outro filme nos aguardava Stardust, de Neil Gaiman (o criador de Sandman). Este sim vale cada gigabyte baixado. Outra história para um outro dia.
A loja é realmente muito bem arrumada, e oferece muitos vinhos e outras coisas gostosas, e o preço estava bem em conta (cerveja Therezópolis a R$3.89 !). Bom, vamos lá, deixa eu esquecer a cerveja e me enfurnar por aqui e ali, dar uma pesquisada e achar algo que o valha. Sempre me dizem que meu problema com o vinho é o preço dos que compro, mas fica complicado um mamão como eu pagar trinta e cinco reais numa garrafa espetacular e não achar nada de mais.
Procurei pelos vinhos chilenos e argentinos, já que pelo que leio, oferecem um ótimo custo-benefício (note bem essa palavra, custo-benefício...). Olha daqui, bisbilhota dali, eu to sem muita grana, então achei que comprando um entre 15 e 20 reais seria uma boa escolha, ou pelo menos não poderia ser tão ruim né?
Fiquei entre um argentino e um chileno. Bom, nessa hora uma opinião de quem entende é o necessário, então eu e minha namorada fomos ao sommelier, ao vouletier, sabe-se lá qual o nome do cara que conhece disso. Com toda a tranqüilidade pergunto:
“Amigo, estou em dúvida entre este chileno e este argentino. Qual você me recomendaria para acompanhar alguns quei...”
“Escolhe este (o argentino). Este chileno é reservado, difícil, mais complexo, enquanto este é um bom vinho. Ele é honesto.”
“Honesto?”, eu redargüi.
“É, por este preço... Ele é bem honesto”.
Porra. Por este preço? Que raios isso quer dizer? A honestidade do vinho tem a ver com o preço? Aliás, que merda é essa de honestidade? Aliás, não, aliás mesmo, alguém pode me explicar se o cara estava tirando onda comigo ou não? Eu estou até agora achando que o cara me tirou...
Acabou que ainda levei o vinho só para entender o que ele queria dizer com essa tal honestidade. Não entendi a palavra, mas era um bom vinho no final das contas.
Honestidade ... sei...
Ps: O motivo da Foto? O cidadão atrás ao centro, o espetacular Johm Entwistle, era um famoso apreciador de vinhos (e outros aditivos mais ...). Em 27 de junho de 2002, um dia antes da abertura da turné americana do The Who, o baixista foi encontrado morto em seu quarto no Hard Rock Hotel e Casino, em Las Vegas. Ao seu lado, reza a lenda, garrafas de vinho e cocaína.